Recensão por: Frederico Cantante.
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Witte, James C. e Susan E. Mannon (2010), The Internet and Social Inequalities, Nova Iorque, Routledge. 

A Internet reproduz e acentua as desigualdades sociais. Análise deste fenómeno deve ir além da mera questão do acesso à Internet e debruçar-se sobre os seus usos.

Em The Internet and Social Inequalities, James C. Witte e Susan E. Mannon dispõem-se a demonstrar que as assimetrias no acesso e uso da Internet emergem da e reproduzem a lógica estratificada e desigual de distribuição dos recursos económicos, culturais ou simbólicos na sociedade norte-americana. É esta a hipótese geral de estudo que comanda a argumentação dos autores e a exposição estatística ao longo da obra. Os autores promovem, porém, um desdobramento dessa hipótese mais geral em três sub-hipóteses, cada uma das quais orientada por uma perspectiva específica de conceptualização das desigualdades sociais: a perspectiva “conflitual”, “culturalista” e “funcionalista”. É através da adequação destas três perspectivas à relação entre as desigualdades e a Internet que os autores definem a lógica e a sequência argumentativa da análise.

O património teórico da perspectiva “conflitual” conduz os autores a procurar testar até que ponto a Internet pode ser entendida como um meio usado pelas classes dominantes para reproduzir os seus recursos e a sua posição na estrutura social. Tendo como referência as premissas básicas do olhar marxista, mas refrescando-as com os contributos de Erik Olin Wright, os autores procuram demonstrar que nos Estados Unidos o acesso à Internet e as competências necessárias na sua utilização tendem a variar de acordo com o nível de rendimento, de educação ou a origem social. São os mais ricos, escolarizados e que desempenham profissões mais qualificadas, bem como os que provêm de famílias detentoras de recursos económicos e escolares mais elevados, os que mais acedem à Internet e mais competências demonstram ter na sua utilização. Sendo as competências no uso de Internet valorizadas no mercado de trabalho e um capital estruturante dos lugares de classe, a sua posse é determinante na produção das desigualdades sociais e na reprodução familiar dos recursos económicos e escolares.

Relativamente à aproximação “culturalista” a esta problemática, interessa aos autores analisar até que ponto as desigualdades de classe na utilização da Internet são acompanhadas e estão relacionadas com as desigualdades de prestígio ou status. Analisa-se, portanto, a problemática das desigualdades sociais de acordo com a proposta teórica e conceptual de Max Weber. A operacionalização do conceito de status social é feita, num primeiro momento, a partir do nível de prestígio da profissão desempenhada e da origem familiar. A este nível, conclui-se que os indivíduos com níveis de status social mais elevados tendem também a usar mais frequentemente a Internet. Os autores procuram depois conceptualizar os usos da Internet enquanto práticas integrantes dos estilos de vida dos indivíduos. Concluem que o tipo de usos desta tecnologia e o seu nível de diversificação variam de acordo com o capital escolar e económico: os mais escolarizados e abastados tendem a usar a Internet num conjunto mais alargado de actividades comparativamente aos que têm menores recursos escolares e económicos e, ao contrário destes, usam-na com bastante intensidade, por exemplo, em tarefas laborais ou na compra de produtos.

Por último, analisa-se o fenómeno das desigualdades no uso da Internet a partir dos pressupostos do pensamento funcionalista. Até que ponto estas desigualdades decorrem da divisão do trabalho, mais concretamente das recompensas diferenciadas atribuídas a quem desempenha actividades funcionalmente mais relevantes para a sociedade? Para responder a esta questão os autores analisam a evolução da organização e tipos de conteúdos presentes na página inicial do portal Yahoo!. Concluem que o tipo de informação comercial e outros serviços disponível nessa página está essencialmente vocacionado para os utilizadores com maiores recursos económicos e mais qualificados. Nesse sentido, a Internet premeia este tipo de utilizadores.

Este livro apresenta uma abundante informação estatística relativa às desigualdades de uso da Internet nos Estados Unidos. E promove um diálogo interessante entre este fenómeno e as três perspectivas teóricas mencionadas. Contudo, fica a ideia de que nem sempre os indicadores analisados são suficientemente robustos ou adequados para testar as hipóteses de estudo formuladas – principalmente no capítulo dedicado ao funcionalismo.

Frederico Cantante   

Publicado originalmente em Observatório das Desigualdades, 2011 
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